quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

1994 - O Ano em que Hollywood conheceu Jim Carrey


Um dos comediantes mais populares da história recente, Jim Carrey completou nesta quarta-feira (17) 56 anos. Dono de uma característica própria de atuar, uma performance física que se tornou referência dentro da comédia, o ator canadense foi uma das maiores (e mais rentáveis) estrelas de Hollywood na década de 1990. Uma ascensão que, verdade seja dita, aconteceu praticamente da noite para o dia. Assim como muitos aspirantes ao estrelato, Carrey teve que enfrentar gigantescos obstáculos para ganhar a sua chance. Com uma comovente história de vida, ele acreditou no seu sonho, enfrentou a miséria e as vaias, até que em 1994, após uma série de trabalhos menores na TV e no Cinema, a sua oportunidade surgiu. E Jim Carrey estava preparado para, num mesmo ano, emplacar três populares blockbusters, um fato ainda hoje raríssimo em Hollywood. 


Jim Carrey em 1983
Antes de alcançar este feito, porém, Carrey teve que cortar um dobrado. Filho de um músico de Jazz e uma dona de casa, o então jovem canadense sentiu logo cedo os perigos de dedicar a sua vida ao mundo da arte. Ainda adolescente, ele viu o seu querido pai, Percy Carrey, ter que largar o seu sonho para conseguir um emprego "normal". Trazendo no sangue a sua veia cômica, Jim já arrancava risadas na sala de aula, mostrando um dom que viria a ser mais bem trabalhado nos anos seguintes. Mas não no ambiente escolar. Isso porque, diante da crise financeira, o então aspirante a humorista viu o seu pai perder o emprego e a sua família enfrentar uma situação financeira crítica. Em entrevista ao Inside The Actors Studio, Carrey afirmou que durante parte da sua adolescência teve que viver numa van ao lado dos pais e dos irmãos, o que o motivou a largar o colégio e arrumar um emprego como zelador. Isso aos quinze anos. No fantástico documentário Jim e Andy: The Great Beyond (leia a nossa opinião), Carrey foi além e revelou a situação do seu pai o ajudou a entender a sua vocação enquanto artista. "O meu pai não era apenas o cara mais engraçado, mas ele era um saxofonista fantástico. E antes de eu nascer ele tinha uma orquestra em Toronto. Mas para ser especial, ele teve que deixar o Canadá e vir para o EUA e se provar aqui. Ele estava um pouco temeroso dessa transição, e ele tinha uma família para cuidar, então ele virou contador. E com o passar do tempo isso o desgastou. Ele ficou um pouco amargo, especialmente quando perdeu o emprego aos 51 anos. Isso realmente o machucou. Quando você se compromete e falha, isso dói muito. Dói ainda mais quando fracassa com o que se ama. Então isso foi um exemplo para mim. Aprendi que podemos fracassar com o que não amamos, então é melhor fazer o que se ama.", sintetizou um emocionado Jim. Bem antes disso, entretanto, ele já havia dado o seu primeiro passo rumo ao stand-up comedy. Aos 14 anos, o então "palhaço da classe" tentou a sorte ao apresentar o seu número num clube local, o Yuk Yuk's. Uma péssima primeira experiência. Após poucos minutos no palco, Carrey conviveu com as primeiras vaias, experimentando o quão difícil seria a sua trajetória dentro do segmento.


No seu caso, porém, o tempo foi um grande remédio. Convencido pelos seus amigos, Jim Carrey voltou a tentar a sorte no stand-up comedy. Aos 17 anos, ele ganhou uma nova chance de retornar ao Yuk Yuk's, uma performance - desta vez - triunfante que significou o estopim da sua carreira. No início de 1980, o então jovem comediante decidiu dar voos mais altos, se mudou para Los Angeles e começou a trabalhar na The Comedy Store. Lá, ele cruzou o caminho do popular humorista Rodney Dangerfield, que, confiando no talento do aspirante, deu a Carrey a oportunidade de abrir os seus shows. Após não ser selecionado para o elenco fixo do Saturday Night Live, Carrey decidiu tentar usar o seu pequeno prestígio no meio em busca de chances na TV e no Cinema. Como a maioria dos iniciantes, entretanto, as oportunidades que surgiam se revelavam menores do que o esperado. Num primeiro momento, ele entrou para o elenco do telefilme Um Debilóide sem Máscara (1981), conseguiu uma participação num episódio da série Buffalo Bill (1984), um personagem fixo na série The Duck Factory (1984), além de pequenos papéis em filmes como Achado Não é Roubado (1984), Peggy Sue, Seu Passado a Espera (1986) e Dirty Harry na Lista Negra (1988). Nesse meio tempo, aliás, Carrey protagonizou o divertido Procura-se Um Rapaz Virgem (1985), uma comédia de baixo orçamento que, verdade seja dita, foi "redescoberta" após o sucesso do ator na década de 1990. O seu primeiro grande papel de destaque, entretanto, veio no início dos anos 1990 com a série In Living Color, uma espécie de "primo pobre" do SNL que lançou nomes como os irmãos Damon, Marlon e Kennen Wayans, Jamie Foxx, Jennifer Lopez, Chris Rock entre outros.


Neste momento, porém, era difícil prever que Jim Carrey se tornaria uma grande estrela do gênero nos anos seguintes. Mas ele acreditava em si mesmo. Tanto que, já depois do estrelato, em entrevista a apresentadora Oprah Winfrey, ele confidenciou que, no início dos anos 1990, assinou um cheque de US$ 10 milhões em seu nome, datado para 1995. Haja confiança. Um sonho que, apesar do sucesso de In Living Color, parecia longe de acontecer. Prova disso é que, entre 1990 e 1993, Carrey lançou pouca coisa relevante fora da TV, uma "janela" que, na época, não era tão lucrativa quanto nos dias de hoje. Eis que, da noite para o dia, o seu esforço e dedicação foram recompensados. Silenciosamente, Jim Carrey começou 1994 em grande estilo com o sucesso Ace Ventura (1994). Sob a batuta de Tom Shadyac, o longa, apesar das críticas negativas, se tornou um estrondoso sucesso de público, faturando US$ 107 milhões ao redor do mundo, um valor impressionante diante do baixo orçamento, cerca de US$ 15 milhões, e por se tratar do primeiro grande filme estrelado por Carrey. Na pele de um expansivo e afetado detetive de animais, ele encontrou a liberdade necessária para exibir o seu humor performático, uma hilária entrega física que viria a ser consagrada não só na continuação, o sucesso Ace Ventura 2: Um Maluco na África (1995), como também nos seus dois próximos trabalhos.


O período sem grandes lançamentos cinematográficos entre 1992 e 1993, entretanto, ganhou uma explicação óbvia quando, pouco tempo depois do bem sucedido Ace Ventura, Jim Carrey voltou aos holofotes com o fantástico O Máskara (1994). Lançado nos EUA em Julho, o longa dirigido por Chuck Russell consagrou o então promissor astro da TV ao tirar do papel um dos personagens mais queridos da cultura pop nos anos 1990. Dando vida a um pacato banqueiro que, ao usar a poderosa máscara de Loki, se transformava numa figura verde e zombeteira, Carrey elevou o seu (impagável) histrionismo a máxima potência ao encarar este cartunesco anti-herói. Mesmo sob uma pesada maquiagem, o ator desfilou as suas caras e bocas num blockbuster engraçadíssimo, reafirmando a popularidade do seu estilo de humor ao conseguir expressivos US$ 351 milhões ao redor do mundo. Simplesmente, a quarta maior bilheteria de um ano que teve o lançamento de clássicos como O Rei Leão, True Lies e Forrest Gump. O fato é que, em pouco mais de sete meses, Carrey foi da promessa da TV ao estrelato em Hollywood, uma ascensão repentina que parecia fazer parte de um conto de fadas. A dura realidade, porém, voltou a bater a sua porta quando, em meio ao sucesso, o ator precisou lidar com a morte do seu pai, em setembro, ao 67 anos, vítima de um câncer de pulmão. Ao documentário Jim e Andy: The Great Beyond, Carrey se mostrou feliz em ter conseguido, ao menos, mostrar parte do fruto do seu esforço à Percy. "O meu pai não pôde ver tudo, mas ele viu acontecer, e aconteceu para ele tanto quanto aconteceu para mim. É por isso que fico emotivo. Todos ficam emotivos quando falam dos seus pais, mas ele era um ser humano incrível." definiu o ator que, num gesto de gratidão, afirmou ter o colocado o simbólico cheque de US$ 10 milhões feito por ele próprio, lá atrás, antes do estrelato, no bolso do seu pai onde ele foi enterrado.


O ano de 1994, entretanto, ainda reservava surpresas para Jim Carrey. Três meses após a morte do pai, mais precisamente em Dezembro, o (então) novo astro de Hollywood retornaria a grande tela num dos trabalhos mais populares da sua filmografia, o inesgotável Debi e Lóide: Dois Idiotas em Apuros (1994). Dirigido pelos irmãos Peter e Bobby Farrely, o longa foi recebido com críticas mistas, mas aclamado pelo público ao redor do mundo. Na pele de um imbecil que, na ânsia de ajudar, se envolve num sequestro milionário, Carrey fechou o ano numa das grandes comédias da década de 1990, indo além do humor físico ao tirar da cartola um personagem engraçadíssimo. O sucesso, obviamente, foi inquestionável. Com orçamento de US$ 17 milhões, Debi e Lóide arrecadou US$ 247 milhões mundialmente, reforçando a popularidade internacional de Carrey. Um status que, verdade seja dita, já havia sido solidificado com Ace Ventura, já que enquanto Carrey recebeu US$ 7 milhões para estrelar a película, o seu parceiro Jeff Daniels, um ator de origem dramática que pouco tinha feito na comédia, recebeu modestos US$ 50 mil. Para se ter a exata noção da mudança de patamar de Carrey em Hollywood, segundo o THR, no final de 1993, ele recebeu cerca de US$ 350 mil para estrelar Ace Ventura. Que valorização! Além disso, ele foi o vencedor do MTV Movie Awards na categoria Melhor Performance Cômica, uma conquista na época relevante e que ajudou a coloca-lo entre os gigantes da comédia. Em apenas um ano, o então promissor humorista da TV "rendeu" cerca de US$ 706 milhões com as bilheterias de Ace Ventura, O Máskara e Débi e Lóide, um desempenho fantástico que o transformou num dos atores mais lucrativos da época. No ano seguinte, inclusive, Jim Carrey recebeu US$ 20 milhões para protagonizar a comédia de humor-negro O Pentelho, fechando o ano de 1995 com um cheque bem mais "gordo" que havia previsto anteriormente.


Sem medo de seguir arriscando, Jim Carrey procurou se entregar de corpo e alma a sua arte. Com uma inquietude cada vez mais rara em Hollywood, ele usou o seu prestígio em prol de trabalhos mais audaciosos, ampliando o seu status estrelar ao protagonizar não só as suas rentáveis comédias, entre elas Ace Ventura 2: Um Maluco na África (1995), O Mentiroso (1997), Eu, Eu Mesmo e Irene (2000), Todo Poderoso (2003), As Loucuras de Dick e Jane (1995) e Sim, Senhor (2008), como também projetos mais autorais, incluindo o fantástico O Show de Truman (1998), o dramático O Mundo de Andy (1999), o subestimado Cine Majestic (2001) e o hit cult Brilho Eterno de Uma Mente sem Lembranças (2004). Embora nos últimos anos o ator tenha se distanciado dos holofotes e dado voz a sua faceta mais complexa, vide a sua transloucada entrevista recente ao canal E!, Jim Carrey construiu uma filmografia digna dos mais sinceros elogios, se tornando o homem que, após experimentar o lado B de Hollywood, precisou de um ano e uma trinca de lucrativos filmes para se estabelecer como um dos mais populares (e ainda hoje reverenciados) astros da comédia mundial. 

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