quarta-feira, 12 de abril de 2017

Apostando Tudo

A reabilitação de um perdedor

Nos últimos dias escrevi uma matéria sobre a musa do cinema 'indie' Greta Gerwig, estrela de filmes como Frances Ha, Mistress America e o recente Mulheres do Século XX. Na matéria falei sobre o movimento 'mublecore', uma corrente do cinema independente conhecida pelos seus filmes de baixo orçamento, com muito improviso e atores completamente desconhecidos. Um dos principais nomes deste segmento, o diretor Joe Swanberg encontrou no Netflix a liberdade necessária para dar sequência a sua carreira, conseguindo alcançar um público mais expressivo com a série Easy e agora com a comédia Apostando Tudo. No projeto mais "acessível" da sua filmografia, o realizador norte-americano se mantém fiel ao seu estilo ao entregar ma obra honesta e descompromissada. Embora peque ao explorar a questão do vício em jogos com inadvertida conveniência, o longa envolve ao narrar a desaventurada jornada de um apostador arrependido, encontrando no carismático Jake Johnson a energia necessária para elevar o nível de uma requentada premissa. 



Reconhecido por valorizar o improviso e a capacidade do elenco de construir uma cena a partir de uma ideia ou tema, Joe Swanberg constrói uma comédia que não preza pelo poder dos diálogos. Não espere, portanto, uma sucessão de gags e momentos engraçados. O humor, aqui, é utilizado de maneira mais suave, geralmente potencializado pela química entre os protagonistas e pelo seu afiado tempo de comédia. Inicialmente lento e pouco convidativo, o argumento assinado pelo próprio realizador, ao lado de Jake Johnson, acompanha os passos de Eddie, um viciado em jogos que levava uma vida de pouca responsabilidade. Sem emprego fixo e esposa, ele apostava o que conseguia em pequenos bicos, para a frustração do seu irmão Ron (Joe Lo Truglio, ótimo), o dono de uma empresa de jardinagem. Tudo muda, no entanto, quando Eddie decide abrigar a bolsa de um condenado a prisão por seis meses. Curioso, ele descobre que o homem havia escondido US$ 100 mil na mochila. Tentado pela jogatina, Eddie não demora muito para usar o dinheiro, iniciando um círculo vicioso que viria mudar a sua rotina de uma vez por todas. 


Após um primeiro ato que se sustenta basicamente no talento de Jake Johnson e na direção naturalista de Joe Swanberg, Apostando Tudo "pega no tranco" no momento em que adiciona elementos mais humanos a trama. Indo de encontro ao genérico pano de fundo envolvendo o mundo das apostas, um tema batido explorado com enorme conveniência pelo roteiro, o realizador é cuidadoso ao consolidar o processo de transformação do protagonista. Inicialmente vazio e desinteressante, Eddie ganha nuances mais atrativas quando ele passa a enxergar a possibilidade de mudar a sua vida. Mais do que explorar os perigos em torno do vício em jogos, Swanberg se preocupa em tornar crível a jornada de amadurecimento do personagem, a sua relação com o mundo adulto, dando uma abordagem mais pessoal ao explorar a relação do apostador com o seu irmão e a sua nova namorada (a magnética Aislinn Derbez). Fazendo um excelente uso dos improvisos e dos planos sequências, o diretor constrói cenas intimistas e honestas, permitindo que o público experimento o sopro de esperança de Eddie e sinta os perigos em torno da tão temida recaída. No momento em que a trama parecia caminhar para um desfecho amadurecido, entretanto, Swanberg se contenta em seguir um rumo mais escapista, dando uma roupagem apenas autêntica para o previsível clímax.


Em meio a inegáveis altos e baixos, o charme de Apostando Tudo reside no autoral estilo de filmagem de Joe Swanberg. Usando cenários reais, luz natural e atores amadores, o realizador é habilidoso ao aproximar o 'mumblecore' do cinema comercial, criando uma obra recheada de realísticos diálogos vazios e situações bem rotineiras. Por diversas vezes, inclusive, a impressão que fica é que o diretor colocou Jake Johnson para atuar em locais públicos, como nas sequências envolvendo o jogo do Chicago Cubs e o dia de apostas no Jockey. Quando necessário, porém, Swanberg é cuidadoso ao traduzir a emoção dos personagens, vide a envolvente relação entre os irmãos, realçando a interação entre os seus comandados através de imersivos planos médios e fluídos movimento de câmera. Dito isso, embora narrativamente frouxo, Apostando Tudo cativa ao oferecer uma abordagem particular para uma premissa genérica. Falho enquanto comédia, o longa contorna os momentos mais lentos ao valorizar o senso de humanidade do seu protagonista, um homem comum e inconsequente que se vê em apuros no momento em que finalmente encontra a oportunidade de construir algo sólido na sua vida. 

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