terça-feira, 3 de janeiro de 2017

Cinemaniac Indica (Sing Street: Música e Sonho)

Lançado recentemente via Netflix no Brasil, Sing Street: Música e Sonho é mais uma das pérolas musicais do excelente diretor John Carney. Após os revigorantes Apenas uma Vez (2007) e Mesmo se Nada der Certo (2013), o eclético realizador nos brinda não só com um pulsante retrato sobre o pop\rock britânico da década de 1980, mas também com um relato comovente e vigoroso sobre a difícil missão que é amadurecer.

Com uma trilha sonora recheada de clássicos, que vão de A-Ha a The Cure com enorme energia, o cativante longa narra a jornada do deslocado Conor (Ferdia Walsh-Peelo), um adolescente vidrado na cultura pop que vê a sua rotina mudar drasticamente no momento em que é obrigado a se transferir para um conservador colégio católico. Acuado e com poucos amigos, ele se encanta repentinamente pela beleza de Raphina (Lucy Boynton), uma jovem aspirante à modelo que morava em frente ao seu novo lugar de estudo. Empurrado pelo seu único amigo, o carismático Darren (Ben Carolan), ele resolve se aproximar dela e a convida para a gravação de um videoclipe. O único problema é que Conor sequer tinha uma banda. Apoiado pelo seu irmão mais velho, o idealista Brendan (Jack Reynor, magnífico em cena), o jovem decide encontrar colegas dispostos à participar desta empreitada, encontrando no poder da música o empurrão necessário para encarar de frente os obstáculos que o cercam.


Com base nesta premissa tipicamente oitentista, John Carney vai bem além do romance 'teen' ao transitar por temas mais densos e delicados. Sem nunca abrir mão da vibe otimista, o diretor e roteirista expõe a castradora realidade enfrentada por estes garotos ao falar com sensibilidade sobre o conservadorismo, a violência doméstica, o divórcio, a falta de oportunidades e a frustração quanto aos objetivos que não se realizaram. Em sua essência, porém, Sing Street se rebela justamente contra esta resignação e valoriza a capacidade daquele que se livra destas amarras e segue o seu sonho. Da afetuosa relação entre Conor e Brendan, inclusive, nasce um arco irretocável, uma passagem de bastão emocionante embalada pela fantástica trilha sonora original e por lições de rara sinceridade. Sem querer revelar muito, a cena em que o garoto vê o seu "herói\mentor" desmoronar à sua frente é de cortar o coração, um momento intimista que só um diretor com faro apurado poderia extrair.


Num todo, aliás, Carney pontua este 'feel good movie' com sequências inesperadamente incisivas, momentos fortes que só tornam a transformação do protagonista mais crível aos olhos do público. Além disso, o diretor irlandês é perspicaz ao recriar o peculiar cenário oitentista, buscando inspiração no visual de algumas das grandes bandas da época para compor o figurino dos seus personagens. Contando ainda com a vibrante performance do jovem Ferdia Walsh-Peelo e a magnética presença da talentosa Lucy Boynton, Sing Street é uma produção com alma juvenil, um longa que, ao compartilhar do espírito indomável dos seus personagens, traz consigo uma mensagem esperançosa, por vezes inocente, mas absolutamente libertadora. 

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