sábado, 14 de março de 2015

Golpe Duplo

Elegante e charmoso, longa peca pela fragilidade dos seus golpes


Dirigido pela dupla Glenn Ficarra e John Requa, responsáveis pelo interessante O Golpista do Ano (2009) e pelo impecável Amor a Toda Prova (2011), Golpe Duplo tem quase tudo o que um bom filme sobre trapaceiros poderia ter. Quase tudo... Enquanto chama a atenção por seu visual elegante, pelo preciso senso de humor, pela trama ágil e pelo inegável charme da dupla Will Smith (Independence Day) e Margot Robbie (O Lobo de Wall Street), o longa peca pela falta de criatividade no desenvolvimento de seus golpes. Contando com o brasileiro Rodrigo Santoro como uma espécie de coadjuvante de luxo, Ficarra e Requa parecem, na verdade, se contentar em explorar as nuances envolvendo a relação amorosa dos dois picaretas, deixando toda a trapaça em segundo plano. Em meio a truques baratos e personagens convincentemente dúbios, o longa inegavelmente funciona como entretenimento, mas perde parte de sua força ao não conseguir encontrar o coelho em sua cartola. 


Disposto a apresentar o submundo dos pequenos furtos, com direito a um esperto primeiro ato, onde o 'modus operandi' dos trapaceiros é esmiuçado com louvor, o roteiro assinado pela dupla é eficiente ao esconder as verdadeiras intenções por trás dos seus protagonistas. Apostando em bem sucedidas doses de humor, potencializadas pelo retorno de Will Smith ao gênero que o consagrou, o longa narra a história de Nick (Smith), um experiente trapaceiro que se torna alvo de uma frustrada tentativa de golpe. Nele, Nick conhece a bela Jess (Robbie), uma golpista novata que logo de cara chama a atenção do criminoso. Enxergando nela o talento para os pequenos golpes, o criminoso decide dar uma chance para a jovem, iniciando assim um treinamento para que ela possa entrar no seu grupo. Visivelmente encantado pela beleza de Jess, Nick deixa a frieza de sua "profissão" em segundo plano e logo se envolve amorosamente com a novata. Esta relação, no entanto, acaba se tornando uma espécie de "calcanhar de Aquiles" para ele, principalmente quando Nick decide aceitar um trabalho para um milionário do automobilismo (Santoro). 


Explorando a invejável química entre Will Smith e Margot Robbie, que formam um magnético casal, os diretores são eficazes ao aproveitar as idas e vindas desta relação. Em meio a personagens moralmente corrompidos, o argumento é preciso ao alimentar a incerteza sobre os sentimentos dos dois, mostrando originalidade ao evidenciar a forma como um utiliza o outro dentro dos seus golpes. Enquanto Smith impressiona ao compor um humano golpista, se destacando não só pelo impecável tempo de comédia, mas também ao construir um tipo complexo, Robbie comprova que esta longe de ser só mais um "rostinho bonito" em Hollywood. Símbolo sexual do longa, daquelas que chama a atenção enquanto o roubo é cometido, a estonteante australiana encanta ao capturar as nuances de sua personagem, indo da frágil à cínica com uma hipnotizante habilidade. Uma relação extremamente agradável, que rende momentos ora afetuosos, ora perspicazes. Com destaque para a cena em que Nick ensina à Jess as suas artimanhas. Por outro lado, o roteiro é um dos pontos mais frágeis do longa. Além de não atingir as expectativas em torno do grande golpe, o argumento tem uma gigantesca quebra de ritmo do primeiro para o segundo ato, quando uma trama praticamente nova se inicia. Pior para Rodrigo Santoro, que se torna um antagonista de luxo nesta metade final. Na verdade, por mais que o talentoso brasileiro não precise de muito para se destacar, chega a ser frustrante o pouco espaço dado a um personagem de aparente importância para a trama.


Demonstrando estilo ao construir esta trama, que passeia com elegância por cidades como Las Vegas, Nova Orleans e Buenos Aires, Glenn Ficarra e John Requa fazem de Golpe Duplo uma espécie de grande truque. Um filme que prometia surpreender, mas que se revela "apenas" uma descompromissada e divertida história de amor entre dois trapaceiros. Ainda que a reviravolta final seja realmente interessante, principalmente pela qualidade dos diretores ao desenvolverem a tensão, e que o afiado senso de humor seja um trunfo valioso, com destaque para a hilária atuação de Adrian Martinez (A Vida Secreta de Walter Mitty), a impressão deixada é que a esperada carta na manga dos realizadores não era a das mais altas.

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